18 outubro 2010

NECESSIDADES BÁSICAS

Por alturas da primeira guerra do golfo, quando os beligerantes se preparavam para a contenda, um jornalista decidiu entrevistar o comandante de uma determinada companhia britânica que tinha a fama, e ao que parece também o proveito, de fazer sempre o “trabalho” bem feito. A certa altura da entrevista o jornalista perguntou ao coronel qual era o segredo para que a sua companhia fosse sempre tão “eficaz” no cumprimento das missões. A resposta saiu cristalina: O segredo está no estômago. Os meus homens sabem que têm as suas necessidades básicas asseguradas e a necessidade primeira é a alimentação. Um soldado esfomeado jamais conseguirá cumprir convenientemente a sua missão.
Lembrei-me deste episódio quando, ontem, li as conclusões de um estudo sobre as carências alimentares dos nossos jovens onde se conclui que 12% dos alunos vão para a escola com o estômago vazio. O estudo apurou ainda que no ano passado essa percentagem tinha sido já de 8% e que no próximo será ainda bem mais grave. Este é já o principal factor do insucesso escolar.
Há vinte anos, por alturas da guerra do golfo, Sócrates não tinha tempo para estas minudências. Coisas bem menos prosaicas, como a escolha de uma boa escola de engenharia para fazer a sua formação, ocupar-lhe-iam o espírito, de modo que não terá ouvido o Coronel. Foi pena. Se o tivesse ouvido talvez tivesse pensado em alimentar os nossos jovens convenientemente antes de enxamear as escolas com computadores. Não sei quem lhe terá dito que se abarrotasse as escolas de computadores, internet e quadros interactivos os nossos alunos, como que por magia, ficavam mais inteligentes e, dentro de meia dúzia de anos, ninguém notaria a diferença entre Portugal e a Finlândia. Não sei quem lhe terá dito, mas sei que doze em cada cem computadores já estão parados. Os donos têm de lutar por prover as necessidades básicas e essas não são, com certeza, um computador.

16 outubro 2010

À TRIPA-FORRA

Ontem, a propósito da publicação dos rankings das escolas, ouvi duas declarações que, não fora a responsabilidade de quem as produziu, ter-me-ia rido a bandeiras despregadas.
A primeira foi feita pelo Director do colégio colocado em primeiro lugar, ou num dos primeiros lugares, do Ranking. Procurando uma declaração do Director que lhe ilustrasse a notícia, o jornalista começou por lembrar os ouvintes que se tratava de um colégio privado, logo não ao alcance da esmagadora maioria da população. “Não - refutou o director -, nós nunca rejeitamos ninguém, se tivermos vaga aceitamos todos os que nos procuram.” Depois de ouvir esta pérola não pude deixar de pensar que o dito colégio tem muita sorte em tê-lo como director, se o tivesse como aluno, com toda a certeza, não estaria tão bem classificado.
A segunda declaração do dia foi produzida pela Ministra da Educação quando lhe pediram, tão só, um comentário acerca da discrepância entre os resultados das escolas públicas e das escolas privadas. O depoimento foi o maior arrazoado que eu já ouvi sobre o tema: … hum, os resultados da escola pública decorrem do facto de ser uma escola aberta onde todos estão onde as crianças que têm mais dificuldade estão a ser apoiadas e as crianças que aprendem bem também estão portanto é uma escola onde não há selecção de alunos, todos são convidados a estar na escola e a aprender ao seu ritmo com o esforço para que todos aprendam bem o melhor possível mas sabendo nós que os seres humanos são diferentes e que as condições de apoio devem ter em consideração a diversidade dos seres humanos.” A senhora ministra, que até é escritora, sabe, com certeza, o elevado valor das palavras, para poderem ser usadas assim à tripa-forra. Reconheço, humildemente, que não conheço a sua obra - a Enid Blyton chegou primeiro e tive de me haver com ela - mas não duvido que gasta apenas as palavras que são necessárias. Então por que é que, de há uns tempos para cá, teima em dizer coisas que ninguém entende e outras que nos fazem rir? A senhora, até porque é ministra da educação, deveria ter usado um registo mais pedagógico e ter chamado à atenção do jornalista dizendo-lhe somente: “Esses dados não são comparáveis!” O senhor entenderia, poupava, e muito, nas palavras e informava de um modo que todos compreendiam. Assim…