29 julho 2006

ORA DI DJUNTA MON TCHIGA



E eu que não sou Deus!
E eu árido de respostas!
E eu vazio de verdades!
E eu que apenas sou África
nos entretantos das minhas
Comodidades!

...

José Luís Carvalhido da Ponte, ora di djunta mon tchiga.
Extracto do poema “é quase noite”



José Luís Carvalhido da Ponte é professor por vocação e poeta por devoção. Ontem assisti ao lançamento da sua mais recente obra: ora di djunta mon tchiga. O título, em crioulo, significa, em língua de branco, é a hora de darmos as mãos.
José Luís, 57 anos de idade – completá-los-á dentro de 19 dias, a 17 de Agosto – cumpriu, no início dos anos 70 do século passado, o serviço militar na então colónia portuguesa da Guiné. Ter-lhe-á ficado algo daquela terra – agarrado não sei se ao corpo se à alma – porque trinta anos depois de lá ter aportado pela primeira vez, regressou. Embora o objectivo tivesse sido trabalhar na formação de professores de Português na Guiné-Bissau, o apelo da terra amada terá sido bem forte. Desde essa altura tem regressado todos os anos.
Ele não o disse mas pareceu-me adivinhar nas suas palavras que a cada novo regresso o seu amor por aquela terra, onde apenas não falta o sorriso, a alegria e a amizade, cresce mais e mais – se desaparecessem as árvores, as plantas, os animais e o Sol, a Guiné não teria mais nada, diria. Fazendo a comparação entre a terra que deixou no regresso da guerra colonial e o país que encontrou no dealbar deste século não se coibiu de afirmar: “- O que vou dizer não será politicamente correcto mas sinto que, mesmo assim, devo dizê-lo: agora é que a Guiné está a ser explorada!” Ainda bem que temos poetas que não se encolhem perante o politicamente correcto! É que dizem as coisas muito melhor que nós dizemos.
Talvez pensando em todas as Djamilas e Marys daquele país Africano, o poeta quer construir uma pequena maternidade no Cacheu. Para ajudar decidiu oferecer a totalidade dos lucros obtidos com a venda deste livro de 36 belos poemas e cerca de duas dúzias de belas fotografias. Embora a sua modéstia o mandasse dizer o contrário, os poemas, as fotografias e a nobreza da ideia que está por detrás deste trabalho, valem bem os 15 euros que se paga por ele. Assim a edição esgote rapidamente.
Ora di djunta mon tchiga.

CLARO QUE TENHO FOME!

Claro que tenho fome!
Claro que tenho medo
de esquecer meu nome
de perder meu segredo!

Claro que não sei ler!
Mas não temo sonhar
que um dia hei-de saciar
o ventre de uma mulher.

Hei-de dizer a meu filho
que as árvores morrem de pé.
Ele vai entender, eu confio,
e quando dermos as mãos,
na gramática do amor,
havemos de construir
uma nova Guiné.
Não vês como sei sorrir?

José Luís Carvalhido da Ponte, ora di djunta mon tchiga, Julho de 2006

27 julho 2006

OS "HACKERS" ESTÃO ENTRE NÓS!

Na sua crónica da última página do JN de ontem, como habitualmente, Manuel António Pina, obsequiou-nos com uma história das arábias – um dia este homem há-de ser lembrado como o Cronista do Entroncamento. A história que nos contou leu-a no Washington Post. Rezava mais ou menos assim: No último fim-de-semana, realizou-se em Nova Iorque uma reunião de hackers – a notícia não o diz, ou, pelo menos, o cronista não o refere, mas imagino a Microsoft como sendo o principal patrocinador deste evento. Bill Gates precisa de dormir com o inimigo. A reunião terá sido aberta ao público, pelo menos a algum, porque a certa altura, um dos elementos pediu a uma pessoa da assistência o nome e o endereço de e-mail. Quatro horas mais tarde o especialista apresentou ao incrédulo assistente 500 páginas de dados a seu respeito que tinha surripiado sabe-se lá a quem ou onde, torneando firewalls, contornando antivírus, circundando anti-spyware, ladeando anti-sniffers, enfim... Dessas páginas constavam informações como: lugares onde vivera, automóveis que conduzira, nomes, moradas e fotos de familiares e amigos, o cadastro do irmão, e, pasme-se, o incrédulo assistente foi ainda informado que, desde 1983, outra pessoa andava a usar o seu número da Segurança Social.
Em tempos deixei aqui um post a que dei o nome de PANOPTICON VIRTUAL. Verifico que cada vez mais, as palavras do Viajante Gabriel ganham actualidade: “As pessoas querem acreditar que há uma ilha tropical ou uma gruta nas montanhas onde se podem esconder, mas hoje em dia isso já não é verdade. Quer gostemos, quer não, estamos todos ligados.”

24 julho 2006

NÃO VÁ, TELEFONE!

O governo continua a porfiar no meritório objectivo de colocar a internet ao serviço da simplificação da vida dos cidadãos e do emagrecimento do estado – das contas do estado, entenda-se –, isto é, continua a cruzada pela implementação do simplex. Pena que nem sempre as infra-estruturas estejam preparadas para tão louváveis propósitos. A recente novela da compra do selo do carro, trouxe-me à memória uma célebre frase publicitária com que nos anos 30 do século passado a APT (Anglo-Portuguese Telephone), antepassada dos TLP/CTT e PT, tentou convencer os portugueses a instalarem telefone: NÃO VÁ, TELEFONE! A campanha, mau grado os óptimos métodos publicitários utilizados, não terá surtido o efeito que os seus responsáveis esperariam: além de outros factores, as condições económicas do país não ajudavam. Algumas décadas mais tarde, por alturas da primavera marcelista, quando as taxas de crescimento económico começaram a ter alguma visibilidade, os telefones começaram, finalmente, a ser instalados. Tal era a procura que os problemas de saturação e, consequentemente, de falhas de comunicação, começaram a atormentar a vida dos utilizadores. Daí até à chegada da frase: NÃO TELEFONE, VÁ! foi um ápice.
Senhor primeiro-ministro, para que não nos voltemos a lembrar desta famigerada frase, não seria de alargar as auto-estradas da informação para que não se congestionem sempre que há um aumento de tráfego?

21 julho 2006

HUMOR FINO

Sempre achei a nossa ministra da educação uma pessoa cinzentona, com aquela sua pelezinha esticada, aquele seu estilo lânguido, empalidecido pelos jejuns e mortificações da virtude – como diria Lobo Antunes, se perdesse tempo com estas coisas –, uma daquelas personagens de que os pais se socorrem em momentos de aflição: “- Se não comes a sopa toda vais passar a tarde a casa da dona Maria de Lurdes!”. Sempre achei, até ontem. Afinal a senhora é dona de um finíssimo sentido de humor, que de tão subtil me tinha passado despercebido: Genericamente, os exames correram bem! Disse a boa senhora, ontem, no Parlamento.

19 julho 2006

MUSEU DE CINEMA DE MELGAÇO

Com uma periodicidade ditada pelos afazeres profissionais e domésticos do grupo, eu, juntamente com a Ana, a Andrea, o Bento, a Helena e o Luís, tiramos um dia, ou, pelo menos, parte dele, para nos reunirmos. Invariavelmente as nossas reuniões são compostas por duas partes.
- A primeira, mais teórica, digamos, é passada à roda de uma mesa que o Bento ou o Luís – os maiores experts em gastronomia que conheço, embora a Ana esteja, já, no bom caminho – escolhem. A agenda é aberta de modo que cabem lá todos os temas – se bem que uns mais confessáveis que outros: livros, viagens, discos, férias, filmes, trabalho, colegas, família, alguma política, muita má-língua, pouco futebol, algum fado, Fátima q.b.…
- A segunda, mais social, tanto pode ser uma visita à Igreja do Marco de Canaveses como um passeio pelas íngremes bancadas do incomparável estádio do Braga.
Ontem reunimo-nos na Vila de Melgaço. A primeira parte foi na Adega do Sossego, uma acolhedora casinha onde fomos simpaticamente recebidos e principescamente servidos. Depois de termos passado em revista todos os habituais temas fomos cumprir a segunda parte da nossa reunião: uma visita ao Museu de Cinema de Melgaço.
Jean-Loup Passek é, desde o início dos anos setenta do século passado, o responsável pelo Festival International du Filme de la Rochelle e conselheiro de Cinema do Centro Georges Pompidou. Um dia, já lá vão cerca de trinta anos, o cineasta realizou um documentário sobre a presença dos imigrantes portugueses em França. Na altura travou conhecimento com um casal de trabalhadores Lusos que por lá labutavam. Daí a ter sido por eles convidado para passar férias em Portugal foi um passo. Passek aceitou o convite e eis que rumam a Portugal à terra dos imigrantes – Melgaço. O cineasta ficou encantado. Comprou casa por cá e não mais se desligou da Vila. Um destes dias, a propósito do cinquentenário da Fundação Calouste Gulbenkian, António Barreto dizia que nunca conheceremos todas as razões que levaram a que um dos homens mais ricos do mundo doasse a sua colossal fortuna a Portugal. Talvez Jean-Loup Passek tenha sentido o mesmo que o velho capitalista sentiu ao cá chegar: a simpatia das pessoas, a beleza da terra, a paz que lhe faltava no seu país… O certo é que o cineasta decidiu doar à pequena vila de Melgaço um dos maiores espólios de artefactos cinematográficos que uma pessoa conseguiu reunir, espólio esse que era disputado por grande parte dos países da Europa.
Com a ajuda da Câmara Municipal de Melgaço, conseguiu arranjar-se um espaço que, apesar de nobre, é já, ao que me dizem, exíguo para expor todos os tesouros deste homem. O museu está instalado numa casinha de dois pisos, literalmente, colada à parede protectora da muralha da vila. O edifício, que já foi Posto da Guarda-fiscal de Melgaço, foi minuciosamente reparado e preparado para o efeito.
Lá estão todas aquelas maquinetas imaginadas e laboriosamente construídas pelos gloriosos malucos das máquinas de sonhos que a partir dos finais do séc. XIX começaram a trilhar o árduo caminho que levaria àquilo a que hoje chamamos cinema.
Se passar por perto aconselho-o vivamente a visitar a este acolhedor museu.
A nossa próxima reunião será para os lados de Trás-os-Montes. A mesa, parte importantíssima, estará já escolhida pelos nossos experts. A parte lúdica será uma peregrinação a uma ou outra fraga que em tempos acolheu Miguel Torga nas suas caçadas pela região.
Passando em revista todas as reuniões que já fizemos e a amizade que se foi alicerçando entre nós não posso deixar de me lembrar do poeta de S. Martinho da Anta quando diz que viver é sobretudo amar e ser amado.
Confesso que tenho vivido!

11 julho 2006

SEM EMENDA

Não temos mesmo emenda! Então não é que o Senhor Madaíl vai pedir ao Governo que isente de IRS o prémio devido aos nossos homens da bola pelo facto de representarem o país no Mundial de Alemanha?
Vê-se que este senhor não entendeu nada do que disse o Presidente da República na Alemanha quando instou todos os Portugueses a aproveitarem a energia gerada pela louvável participação portuguesa no mundial, encaminhando-a para outras batalhas. Senhor Gilberto Madaíl, pagar os impostos que são devidos a qualquer rendimento, é uma obrigação de todos e de cada um! Do atleta fora de série que se esforçou por elevar o nome do seu país e do trabalhador que com o ordenado mínimo luta para dar aos seus filhos um futuro melhor. Com dirigentes como o senhor, jamais sairemos vencedores desta contenda. Por favor, desminta-se ou, então, cale-se!
E já agora, será que os verdadeiros interessados ter-lhe-ão encomendado qualquer sermão? Será que o Figo e companhia concordarão com essa monstruosidade? Gostaria de o saber...
Talvez que um destes dias qualquer um deles diga algo sobre o assunto.

09 julho 2006

ITÁLIA CAMPEÃ

Na sua última crónica, antes da final do mundial, Francisco José Viegas dava-nos a conhecer o seu desejo para o jogo: que perdessem os dois. Eu não iria tão longe mas que gostei de ver aquele senhor vestido de corvo saboreando sozinho a derrota, lá isso gostei.

VICTIS HONOR!

A Selecção Portuguesa de Futebol, que no campeonato do mundo da Alemanha conquistou um honroso 4.º lugar, regressou hoje. O país agradeceu-lhes o feito e eles ficaram sensibilizados com esse gesto. Foi bonito de se ver.
Obrigado rapazes! Ficamos a torcer pela vossa próxima vitória.

08 julho 2006

PROFESSORES DE FRANCÊS

Semanalmente, de segunda à sexta, José Coimbra e Carla Rocha, ajudam, estou certo disso, uma quantidade enorme de portugueses a começar alegremente o seu dia. Apresentam o “café da manhã” na RFM e distribuem alegria, inteligência e boa disposição por todos aqueles que os sintonizam. Ontem promoveram um concurso em que ofereciam uma viagem a Estugarda para assistir ao jogo entre Portugal e Alemanha para atribuição do 3.º lugar do campeonato do Mundo de Futebol, ao concorrente que acertasse numa determinada pergunta, geralmente relacionada com o dito. Chegada a vez do 2.º participante – a comunicação era feita por telefone –, depois dos cumprimentos iniciais, o José Coimbra, antes de fazer a pergunta, fez um comentário acerca do recente Portugal – França, perguntando, de seguida, ao concorrente: “Está triste, não? Foi uma pena aquilo que nos aconteceu!”, ao que o concorrente respondeu: “Bom, nem por isso. Sabe eu naquele jogo estava dividido”. “Sim, mas é português!”. “Sim, sou, mas sabe, sou professor de Francês e naquele caso estava realmente dividido”. O José Coimbra costuma ter as respostas apropriadas na ponta da língua. Notou-se pela inflexão da sua voz que as declarações daquele concorrente o apanharam desprevenido, a ponto de não conseguir reagir apropriadamente, caso contrário ter-lhe-ia dito que o regulamento daquele concurso proibia que portugueses divididos nele participassem. Sorte a de todos nós que o concorrente errou a pergunta e, desse modo, o simpático radialista livrou-se daquela nefasta companhia para a viagem até Estugarda. Ouvindo isto veio-me à memória uma conversa que em tempos tive com um amigo meu. A certo ponto dizia-me ale: “Sabes, o meu filho disse-me que a professora de Francês passa a vida a maltratar tudo que é português e a glorificar tudo que é Francês. Diz ela que somos uns ignorantes, uns mesquinhos e uns atrasados e só não vai definitivamente para a França porque a família não a acompanha, caso contrário não ficaria cá nem mais um dia”. Na altura, embora não o tenha feito sentir ao meu amigo, achei um pouco exagerado tudo aquilo – os miúdos efabulam com demasiada regularidade – mas agora depois de ouvir o senhor professor dividido, questiono-me: será que há muitos professores de Francês a prestarem assim este péssimo serviço ao país?
Senhor professor, há ocasiões em que as circunstâncias não permitem que sejamos neutros. Esta, seguramente, era uma delas.
Senhora professora, permita-me que lhe lembre que uma das mais nobres funções de um professor é incutir no espírito dos seus alunos o sentimento do amor à Pátria. À Pátria deles, entenda-se. O país somos nós todos, se vai mal está na nossa mão mudá-lo!

04 julho 2006

100 DIAS

"- Estás a ver - disse-lhe -, nem sempre os grandes poetas são diarreicos, às vezes são obstipados..."
Umberto Eco, Baudolino
Se me não falha a aritmética faz hoje 100 dias que passei a fronteira. Quando um executivo assume funções governativas, é costume, passados que são os cem primeiros dias de governo, fazer um balanço do trabalho realizado. As mais das vezes apenas para nos atormentar a consciência, diga-se, com todas aquelas encenações balofas, tentando – e por vezes conseguindo – convencer-nos do contrário daquilo que fizeram. Para não ficar atrás, registo também esse marco, embora sem a intenção de fazer um balanço. Apenas registar duas notas:
- Primeira: ao contrário do poeta não tenho ainda qualquer razão para imprecar contra este lado da fronteira: ainda nenhum toco de carrasco se me atravessou na frente, pelo que, a menos que me magoe, continuarei;
- Segunda: parafraseando uma modesta cibernauta que encontrei na rede, por intermédio dos dois ou três meus eventuais leitores, visitei uma quantidade enorme de blogs. Não pude deixar de pensar em Baudolino quando dizia ao seu amigo poeta: "- Estás a ver […], nem sempre os grandes poetas são diarreicos, às vezes são obstipados...". Alguns, eram do género diarreico, tal a quantidade de post’s de que faziam alarde. Outros, pelo contrário, eram do género obstipado. Sabe Deus as dificuldades por que terão passado para obrar cada novo post. O meu, reconheço, é mais do género obstipado. Por vezes por falta de tempo; por vezes por falta de motivação; por vezes por falta de veia; por vezes por falta de coragem; por vezes porque, simplesmente, no pasa nada.

02 julho 2006

CHORA BRASIL!

Que faltou a esta equipa?
Felipão?

VIVA PORTUGAL!

Portugal continua imparável. Após 120 longos minutos de sofrimento mandamos, mais uma vez, os ingleses para casa. Depois do que lhes aconteceu no Euro'2004, tenho a certeza que, por esta altura, o Ricardo é o inimigo público número um de toda a nação britânica. Sabe tão bem mandá-los para casa depois de tudo o que a imprensa de Sua Majestade escreveu nos últimos dias sobre a Selecção, sobre Portugal e sobre os portugueses.
Viva Portugal!