Ao ler este livro lembrei-me de Bruce Chatwin e da inolvidável aventura “Na Patagónia” em demanda do brontossauro e de Paul Theroux, outro viajante crónico, que tomou fora de casa, em Chicago, “O velho expresso da Patagónia”, foi por ali abaixo e só não chegou ao cabo Horn porque a linha férrea termina antes. E lembrei-me também de Elias Canetti que ouviu “As vozes de Marraquexe” e as verteu num livro espantoso. Lembrei-me destes três viajantes inveterados e fiquei com vontade de reler aqueles livros admiráveis que nos legaram.
No seu livro, Maria João, diz-nos que foi num serão, sentada a ver televisão na companhia do marido, o Zé – assim mesmo, o Zé, como se a gente se conhecesse desde sempre e se desse de abraço. Diz ela que ao ver num documentário três jovens, Jim, Tom e Kate, percorrerem a montanha, sempre acima dos três mil metros, rodeados de paisagens, escarpas e glaciares, teve, naquele momento, a certeza que faria o mesmo. Em tempos li que Gabriel Garcia Márquez, teve, durante uma viagem de automóvel, a mesma visão e, diante dele, viu desfilar todo o enredo da sua obra prima “Cem anos de solidão”. Depois foi só parar, fechar-se longe do barulho, e escrever de empreitada todo o livro que lhe valeria um nobel. Eu, que tomo conhecimento destes prodígios, reconheço, humildemente, que não fui, ainda, tocado por essa graça. Sei, até, de ciência certa, que jamais o serei. Eu, que sei o dispêndio de energia para obrar cada linha, olho para estes prodígios e só me vem à memória o poema “Budapeste” de Billy Collins, poeta americano, que começa assim: A minha caneta move-se pela página/ como o focinho de um estranho animal...